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As escolhidas
1. Moda do Bonde Camarão (Cornélio Pires e Mariano da Silva)

Esta moda-de-viola gravada na segunda leva de discos feitas por Cornélio (a primeira tiragem foi de seis discos com cinco mil cópias cada, embora alguns pesquisadores afirmem terem sido cinco discos). Composta por Cornélio Pires e Mariano da Silva, da dupla Caçula e Mariano, esta música retrata o olhar do caipira, do homem do interior sobre o mundo urbano.
Desde fins do século XIX, os ideais positivistas que aqui se instalaram com a República pautaram por uma modernidade civilista que se opunha diametralmente ao mundo tradicional. Assim, o camponês, o pobre do interior e os ex-escravos viram seu mundo banido da nova São Paulo que se configurava. Antonio Candido aponta que o caipira só era citado em teatros de revista como uma alusão ao ridículo, ao atrasado.
Cornélio Pires que desde 1910 iniciara uma cruzada de exaltação deste tipo, o caipira, viu-se em 1929 realizando as primeiras gravações independentes do país, as gravações da música dos caipiras.
Nesta moda, o olhar do rural sobre a cidade retrata a promiscuidade das relações urbanas retratadas no bonde, onde os opostos se esbarram e se aturam. Cornélio começa com uma narração: “Moço, vancêis já estiveram em São Paulo? São Paulo é lindo, uma buniteza, mas tem um tal Bonde de Camarão que prá chacoalhar o corpo da gente, cada tranco... ô peste dos inferno, é pior que carro de boi. Inté nóis fizemo uma moda-de-viola arrelaxando ele. Ad escuite a moda.

2. Ave Maria (Erothides de Campos), Tristezas do Jeca (Angelino de Oliveira)

Erothides Campos, compositor nascido em  Cabreúva, próximo a Jundiaí, tem como característica forte em suas composições, o lirismo. Aliás, este lirismo era cultuado pelos compositores que entraram século XX adentro já exercendo o ofício da composição. Este lirismo, ao meu ver, provém em grande parte da tradição modinheira.
A descoberta de minérios no continente americano aqueceu o mercado europeu acarretando um crescimento das cidades que lá, como cá, cresceram em função do intenso êxodo rural. Em outras palavras, a cultura popular camponesa inundou as cidades do velho mundo e, num espaço de duzentos anos, esse cozinhar de culturas se resvalando e interpenetrando criou, concomitantemente, os primeiros gêneros das canções populares em diversos países. A ballad na Inglaterra, a ariète na França, a seguidilla na Espanha, a canzonetta na Itália. Portugal, sem uma canção popular a oferecer emprestou do Brasil a modinha e o lundu.
Desde o final dos setecentos e principalmente nos oitocentos reparamos o abismo melódico que se interpõe entre as modinhas brasileiras e as portuguesas, entre as cantigas de roda brasileiras e as portuguesas. Este lirismo, em parte ligado ao bel canto italiano, fez com que a geração que adentrou o século XX compusesse se derramando em melodismos. Villa-Lobos, Marcelo Tupinambá, Erothides Campos e, um pouco mais adiante, Francisco Mignone (que compunha temas sertanejos com o nome de Chico Bororó) nos dão uma bela mostra disso.
A argumentação de que Villa-Lobos compunha uma colcha de retalhos (não desenvolvia os temas e colocava vários diferentes numa mesma música) é rebatida pela idéia de que Villa tentava mostrar seu país em sons, daí a diversidade melódica, de texturas.
Erothides representa com maestria este lirismo consoante à canção paulista do início do século XX.
Embora ainda existam controvérsias acerca da data da criação desta música, se em 1918 ou 1924, é inconteste que Tristezas do Jeca se tornou a canção sertaneja mais conhecida do Brasil. De uma melodia pungente, esta música encanta ao retratar o olhar bucólico e do camponês sobre o seu mundo. Uma canção de amor onde o declamante relata sua semelhança com mundo em que vive. “Eu sou como o sabiá, quando canta é só tristeza, desde o galho onde ele está”.
O cantar sertanejo muitas vezes se imbui de uma leve tristeza, o que realça o sentimento do autor. Gravada inicialmente por Paraguassu, foi eternizada nas vozes de diversas duplas sertanejas.

3. Três Nascentes (João Pacífico), Casinha Branca (Elpídio dos Santos)

João Pacífico, imenso compositor de canções, trouxe à música sertaneja ou caipira, o lirismo que ela não possuía. Mais marcada pelo relato da realidade camponesa, a música caipira narrou os acontecimentos sonhados ou vividos de maneira descritiva, narrativa (o Romance).
João Pacífico trouxe beleza poética à estas narrativas com suas imagens e metáforas.
Elpídio nasceu na pródiga São Luiz do Paraitinga e lá bebeu suas primeiras águas criativas. A riqueza musical do local é retratada em suas músicas que vão da moda de raiz ao fox-trote.
Principal compositor de trilhas para os filmes de Mazzaropi, Elpídio compôs pérolas, dentre as quais destacamos esta guarânia.


4. Menino da Porteira (Teddy Vieira e Luizinho), Fuscão Preto (Atílio Verssuti e Jeca Mineiro)

Gravada na década de 1950 por Luizinho e Limeira, este cururu só alcançou sucesso nacional na voz de um cantor da Jovem Guarda, Sérgio Reis. Este grande intérprete acertou ao mudar de segmento musical e eternizou diversos clássicos dentre os quais Menino da Porteira é o mais celebrado.
Nos anos 1960 a música sertaneja esbarra na jovem guarda e esta fusão, aos olhos das gravadoras, era interessante para atingir um público que não se identificava totalmente com a música sertaneja: os filhos dos migrantes. Esses jovens viviam a idiossincrasia de ter uma educação tradicional em casa e uma diferente na rua, na escola e no trabalho. Assim, o mercado fonográfico apostou na mistura desses dois segmentos  e mirou neste público. A música Fuscão Preto representa este segmento que chegou aos românticos sertanejos dos dias de hoje.

5. Romaria (Renato Teixeira)

O intenso êxodo rural que se processou em nosso país fez com que cidades como São Paulo recebesse uma enormidade de migrantes de várias regiões do país. Embora falemos muito em nordestinos, os grandes contingentes de migrantes para São Paulo foram de mineiros e caipiras do interior de SP, PR e, no caso da Minas caipira, do Sul de Minas e Triângulo Mineiro.
Camponeses e habitantes de pequenas cidades que vinham à cidade grande tentar a vida sem nenhum preparo para tal. Se no campo ou nas cidades pequenas sabiam tudo sobre o tempo, a terra, as plantações e os animais e tinham as estações do ano como regente de seus corpos, quando chegam à cidade terão a máquina como senhora de seus corpos. O que mais necessitariam na cidade: preparo técnico e escolaridade, não tinham. Assim, foram compondo camadas periféricas nas cidades grandes e seus atributos foram tratados como subprodutos culturais por alguns pesquisadores equivocados e consequentemente pelas classes ascendentes
A própria MPB não era resiliente à idéia de fusão de elementos culturais caipiras a si. Haja visto que a música caipira sempre foi gravada em gravadoras “B” (Chantecler, Continental, Copacabana etc) e nunca numa Polygram, Odeon, Ariola, Phillips etc.
Várias tentativas foram feitas no intuito de romper este cerco, mas foi Romaria de Renato Teixeira que efetivamente conseguiu colocar o sentimento caipira à altura da MPB.

6. Tico-Tico no Fubá (Zequinha de Abreu)

Zequinha de Abreu representa bem a vertente paulista do choro e das valsas interpretadas ao piano e tico-tico no fubá ganhou letra e foi eternizada na voz de Ademilde Fonseca.

7. Abismo de Rosas (Américo Jacomino) interpretado por Dilermando Reis

Um marco do jeito “antigo?” que serviu de base ao moderno violão brasileiro, do qual São Paulo responde por uma imensa parcela (Paulinho Nogueira, Rago, Dilermando, Bellinati, Ulisses Rocha, Alessandro Penezzi, Edmilson Capellupi, André Geraissati e tantos outros).
A música do Canhoto eternizada pelo Dilermando. Louvam-se vários através de dois.

8. Bachianinha (Paulinho Nogueira)

Paulinho Nogueira, professor de muitos é o arauto do violão moderno em São Paulo. Dentre suas belas composições Bachianinha ocupa lugar de destaque por criar uma ponte entre as escolas clássica e popular do violão.

9. Samambaia (Cesar Camargo Mariano)

Arrisco dizer que o espaço conquistado no mundo pela MPB nos anos 1970 será reconquistado pela música instrumental brasileira daqui quinze ou vinte anos.
Esta música,a instrumental nasceu com o choro e após perder força nos anos 1930 se revitalizou com os jazz-trio pós bossa nova.
São Paulo respondeu e responde por uma imensa fatia desta música. Cesar Camargo Mariano, aqui representando esta vertente paulista, desde os idos 1970 gravou discos memoráveis de música instrumental como São Paulo Brasil, Samambaia, Ponte das Estrelas dentre outros.

10. Silêncio no Bexiga (Geraldo Filme)

Geraldo Filme mostra o lado da cultura negra paulista. O Samba Paulista. Um samba com traços caipiras no sotaque, no uso da viola, nas fusões rítmicas, no som do terreiro. Tem traços do preto caipira que foi o Geraldo, nascido em São João da Boa Vista. Traços estes que se comunicam com os sambas de lenço e de umbigada do interior paulista.

11. Saudosa Maloca (Adoniran Barbosa)

Adoniran representa uma outra vertente do samba paulista, o samba italiano. Utilizando sua fala dialetal ítalo-brasileira, Adoniran narra o cotidiano paulista e as relações de amor e amizade. Mapeia locais nos subúrbios a partir de suas canções. Em Saudosa Maloca, Adoniran denuncia o avanço imobiliário devastados que toma conta de São Paulo desde início do século XX.

12. Ronda (Paulo Vanzolini)

Um marco da boemia paulistana. Vanzolini, tal qual Adoniran, narrou em suas canções o cotidiano paulista das gentes simples.

13. Velho Ateu (Eduardo Gudin)

Gudin é o grande representante de uma vertente do samba paulista que dialogou com vários segmentos da MPB, quais sejam, a bossa nova e a vanguarda paulistana. Utilizando um suporte harmônico mais complexo Gudin ampliou o universo do samba paulista.

14. Regra Três (Toquinho e Vinícius de Moraes)

Num momento pós bossa nova, Vinícius de Moraes encontra em Toquinho seu grande parceiro e assim seguem até a morte de Vinícius. Toquinho mescla em seu violão as influências musicais de seu mestre Paulinho Nogueira com elementos oriundos da bossa nova. Sua parceria com Vinícius eternizou clássicos como Tarde em Itapoan e Regra Três.

15. Dois mil e um (Tomzé e Rita Lee), Ovelha Negra (Rita Lee)

Gravada pelos Mutantes, Dois Mil e Um tem um forte apelo tropicalista ao trabalhar com o deboche e a fusão de ruídos. A fusão de elementos rurais, como o som da viola, com o rock e elementos sonoros como os utilizados pela dupla Alvarenga e Ranchinho reforçam o caráter tropicalista desta canção. O deboche também se manifesta na maneira como se cantam os trechos caipiras com um tom forçado no sotaque.
Ovelha Negra, da fase pós mutantes, é um marco de época no Brasil. Esta música atingiu toda a juventude urbana. Vários dramas da juventude estão contidos nesta canção que relata o conflito de gerações que se deu a partir dos anos 1960 e 70.
O solo de Carlini, experiente músico paulista, é considerado pelas revistas especializadas no segmento como um dos mais bem sucedidos da história do rock.

16. Trombadinha - São Paulo by Day (Próspero Albanese e Tico Terpins), Inútil (Roger Moreira), Pelados em Santos  (Dinho)

Estas três canções narram as vicissitudes dos diversos confrontos que a cidade de São Paulo abriga. Confrontos de cultura e sócio-econômicos. Nas vozes de cronistas por vezes ácidos e contundentes, o lado grosso (como aponta Mauricio Pereira – isto não é um julgamento de valores) do paulistano se manifesta na fala, no sotaque, nas situações narradas, na estética singular.
Joelho de Porco (Trombadinha) foi um dos precursores, na vertente do rock, de um humor fino apresentado de forma escrachada. Digo na vertente do rock porque Alvarenga e Ranchinho já trabalhavam desde os anos 1930 nesta vertente.

17. Pobre Paulista (Edgar Scandurra), Comida (Arnaldo Antunes, Marcelo Fromer e Sergio Britto)

No início dos anos 1980 o foco das gravadoras deixou de ser a MPB e voltou-se para um rock jovem que se espalhava pelo país. Com uma linguagem mais coloquial e o suporte da grande mídia veiculado pelo jabá, esta vertente logo conquistou o público jovem. De maneira geral, a qualidade do conteúdo musical deixou a desejar, entretanto era este o movimento da grande mídia no mundo.
Não obstante, valores se revelaram e bons grupos conquistaram o seu espaço. Guitarristas de verve como Edgar Scandurra e grupos como os Titãs conquistaram o seu merecido espaço apresentando musicalidade e conteúdo, bem como críticas muito pertinentes à realidade social do país.

18. Pânico em SP (Inocentes)

O punk rock despontou na Inglaterra nos anos 1960 como uma manifestação de jovens operários. A dura realidade de suas letras celebrizou o segmento rapidamente. O punk rock ganhou força e verdade nas grandes cidades de todo o mundo. Os Inocentes representam com muita propriedade este segmento no Brasil.


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